16/02/2014

O Rapaz conta como foi: Linda Martini, no Lux (Convidada especial: Gisela João)


Este artigo foi escrito no contexto da parceria com o Strobe, e como tal, podes vê-lo igualmente neste site (que é bem bonito!)

Jornada dupla de concertos no Lux, ambos completamente esgotados. Assim se mede, observando os frequentes fenómenos de afluência, o cada vez maior e mais evidente reconhecimento e consequente importância que os Linda Martini já conquistaram no panorama musical português. De concerto a concerto, sala esgotada em sala esgotada, a banda portuguesa vai-se agigantando e caminhando a passos largos (se é que ainda não chegou lá) para um estatuto de banda de culto da história da música nacional.
A moldura humana que preenchia o piso inferior do Lux, aguardava expectante e ansiosa o início de um concerto que sabia antecipadamente e com toda a certeza que não iria decepcionar.  É assim que os Linda Martini têm habituado quem os acompanha, e por esse motivo só um inexplicável cataclismo não permitiria que este concerto assim o fosse, um sucesso.
O começo dá-se com “Queluz Menos Luz”, um instrumental presente em “Casa Ocupada”, que representa na perfeição aquilo que transmite o som e essência dos Linda Martini: a poesia muda em forma de post-rock, e o perfeito balanço entre a melodia e agressividade que arrepia e acolhe quem ouve. O mote está dado, público conquistado à primeira canção, e a partir daqui só podia melhorar.  Com “Sapatos Bravos” e “Ratos” canções vindas de “Turbo Lento”(um dos melhores álbuns lançado no ano transacto), as vozes do público fazem-se ouvir em uníssono e autêntica comunhão,  reflectida em tímidos sorrisos dos elementos da banda, já habituados mas sempre incrédulos pela frenética reacção de quem se apresenta em frente do palco. O ambiente intenso e arrebatador já se fazia sentir na plateia, e em palco os músicos insistiam e davam tudo por tudo para impedir que este sentimento se desvanecesse. “Febril” chega como perfeita banda-sonora para personificar o que se sentia naquele momento: “Tenho o sangue a ferver!”, são os gritos de ordem (soltos mais uma vez por todos o que presenciavam) de uma música que se escuta e vive de corpo desperto e dentes cerrados, como  “Belarmino” que os Linda Martini descrevem e exultam na canção que também figurava na setlist da noite.
A chegada de “Partir Para Ficar”, traz consigo o silêncio arrepiante resultante da letra interpretada de forma intensa, que ecoa nas paredes da sala.  A angústia,  o desespero, é esta a mistura de sentimentos inóspitos que os Linda Martini tão bem exploram em variadas canções (Como “Volta” e até “Panteão”, que se seguiram), mas fazem-nos especialmente nesta que tão bem embala e acompanha a letra adaptada do histórico poema de José Mário Branco. Os sentimentos do ser humano podem ser absolutamente inexplicáveis, mas os Linda Martini conseguem interpretá-los, replicá-los nos seus intrumentos… e fazer-nos senti-los de novo.
Perfeito exemplo disso mesmo foi o momento que se seguiu, talvez o mais aguardado da noite. Gisela João sobe ao palco, para dar voz a algumas músicas tocadas pelos Linda Martini. “Hoje é dia dos namorados, e eu tenho de dizer isto: Estou apaixonada por esta banda”, confessa a fadista o que um indisfarçável sorriso já denunciara. “As Putas Dançam Slows”, é a primeira música resultante desta parceria que há muito já se aguardava. As comparações entre a sonoridade saudosista, sentimentalista e intensa dos Linda Martini com o Fado, já lhes tinham valido designações como “Novo Fado”, fazendo deste momento com uma fadista a concretização e confirmação desse mesmo desejo. E de facto, a escolha não poderia te recaído em ninguém mais apropriado do que Gisela João:  fadista dos tempos modernos, desliga-se das habituais aparências, estéticas e “clichés” visuais do fado, e apresenta uma jovial “lufada de ar fresco”, sem desvirtuar em nada o estilo musical que é tão querido e característico da alma portuguesa. Gisela João entrega-se totalmente ao que de facto interessa: a intensidade, sentimento  e poder vocal como há muito não se ouvia na nossa música. É assim que se apresenta no seu fado, foi assim que deslumbrou tudo e todos como temporária vocalista do post-rock dos Linda Martini durante “Pirâmica” e “A Corda Do Elefante Sem Corda”, com coragem suficiente para se lançar num “rockeiro” stage diving.  A despedida da fadista fez-se com “Adeus Que Me Vou Embora”, uma belíssima versão do tema de António Variações que fechou de forma perfeita um momento em que se fez história. A representação de um namoro musical perfeito, em pleno dia de S.Valentim.
“O encore é aquele momento em que as bandas enganam o público. Nós ficamos aqui”, diz o baterista Hélio Morais antes de se lançar de forma animalesca a “Amor Combate” e “Cem Metros Sereia”, a canção que causa apoteose,  euforia e rouquidão muito por culpa da icónica frase “Foder é perto de te amar, se eu não ficar perto”, repetida vezes e vezes sem conta. Esta seria a despedida, não tivessem os Linda Martini acedido simpaticamente aos pedidos de “só mais uma” por parte do público ao tocar “Dá-me a tua melhor Faca”, para júbilo de todos os presentes.
As expectativas do público certamente não saíram defraudadas após esta noite verdadeiramente épica (como já inicialmente se desconfiava), marcada ainda pela brilhante e histórica participação de Gisela João. Irrepetível? Todos desejamos que não.

2 comentários:

Liliana Fernandes disse...

Parabéns. Um blog musicalmente interessante, a visitar mais vezes:)


Pedro disse...

Que grande review, não estive lá mas parece. Escrita soberba.

Parabéns

http://sonsnovento.blogspot.pt/